Nise da Silveira

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Estudiosa influenciada por Carl Gustav Jung, a médica e psiquiatra Nise da Silveira teve sua vida marcada pelos estudos sobre o comportamento humano e o tratamento de patologias psicológicas, como a esquizofrenia. Revolucionou a maneira de tratar os doentes mentais, utilizando técnicas artísticas – pintura e desenho – como terapia. Foi pioneira na pesquisa das relações emocionais entre pacientes e animais, e defendia o fim de tratamentos tradicionais e agressivos,como o eletrochoque, o uso de drogas e o confinamento clínico. Nascida em Maceió, Alagoas, em 1905, Nise ingressou na Faculdade de Medicina de Salvador, em 1921, sendo a única mulher de sua turma, bem como uma das primeiras médicas do Brasil. Trabalhou no Hospital Pedro II, Rio de Janeiro e ficou presa por mais de um ano, denunciada por manter em sua biblioteca livros considerados subversivos. Por discordar dos tratamentos tradicionais, foi transferida para a Seção de Terapia Ocupacional, que se resumia a tarefas de limpeza e manutenção do hospital. Lá revolucionou o tratamento clínico dos pacientes ao criar ateliês de pintura e modelagem. As obras de seus “clientes” comprovaram as teorias de Jung sobre o inconsciente coletivo. No Rio de Janeiro, em 1952, fundou o Museu do Inconsciente para abrigar este acervo e, em 1956, a Casa das Palmeiras, um centro de reabilitação para pacientes egressos de hospitais psiquiátricos.

Nos ateliês os pacientes poderiam desenvolver trabalhos manuais e atividades artísticas como música, pintura, modelagem e teatro. O Museu de Imagens do Inconsciente, com o acervo produzido pelos freqüentadores dos ateliês, atualmente é um patrimônio científico e cultural reconhecido mundialmente. O acervo, hoje com mais de 350 mil obras e documentos históricos, é tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), e está disponível a pesquisadores de todas as áreas do conhecimento.

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Não há dúvida de que o pensamento e a praxis Junguiana foram introduzidos no Brasil pela Dra. Nise da Silveira, no final da década de 1950. Em 1954, impressionada com a recorrência de mandalas nas pinturas de esquizofrênicos, ela escreveu ao psiquiatra de Zurique, Carl Gustav Jung, acerca deste material, sendo prontamente respondida e ganhando colaboração. Isto a estimulou a apresentar no II Congresso Internacional de Psiquiatria, em Zurique (1957), uma exposição com as pinturas e modelagens dos esquizofrênicos que ocupavam as sessões de terapia ocupacional no então Centro Psiquiátrico do Rio de Janeiro (atual Hospital Pedro II). A exposição foi aberta por C. G. Jung na manhã de 2 de setembro. Ele visitou toda a exposição, detendo-se particularmente na sala onde se encontravam as mandalas, fazendo comentários e interpretações. Esta exposição ocupou cinco salas e se chamou “A Arte e a Esquizofrenia”, que teve na presença e entusiasmo de Jung reconhecimento e prestígio.

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Nise e Jung na exposição “A Arte e a Esquizofrenia”

Deste primeiro contato originou-se um relacionamento que não só viria introduzir a psicologia junguiana no Brasil, mas também geraria uma nova abertura para melhor compreensão da psicose e de seus conteúdos. Confirmava-se então, que as atividades expressivas, além de possuírem validade terapêutica, eram também excelente meio para o conhecimento dos processos que se desenrolam na obscuridade do inconsciente. Aplicando à terapêutica ocupacional as descobertas de Jung, abrem-se novas perspectivas para este método. Neste encontro memorável em Zurique, o pensamento de Jung uniu-se definitivamente às teorias de Nise sobre a esquizofrenia e seu tratamento através da terapêutica ocupacional.

Jung documentava a linguagem simbólica do inconsciente coletivo, e nada mais eloqüente que sua manifestação na arte espontânea e desengajada nascida dos esquizofrênicos. Ao mesmo tempo, Nise teve a oportunidade de encontrar uma explicação para aquelas figuras e temas tão recorrentes e, assim, ter acesso à uma metacomunicação que abria para ela segredos da esquizofrenia.

Cerca de uma década depois, o Grupo de Estudos C. G. Jung foi formalmente oficializado como pessoa jurídica e definiu assim sua finalidade: “estudos, pesquisas, divulgação, publicações, cursos, palestras e conferências, referentes a Psicologia Junguiana e ciências afins”. Nise foi a primeira diretora.

Nise dividia suas atividades entre o Grupo, o Museu e a Casa das Palmeiras. O Grupo era reservado aos estudos e pesquisas, o Museu guardava o acervo iconográfico dos esquizofrênicos, que servia de material de pesquisa, e a Casa das Palmeiras era o local onde efetivamente lidava-se com o esquizofrênico e onde aplicava-se o método de Nise. É, pois, neste local que convergia a experiência de Nise em terapia ocupacional, psiquiatria e psicologia Junguiana.

Nise acreditava ter comprovado a tese de Jung sobre os arquétipos e a mente esquizofrênica, e gostava de chamar a atenção para os símbolos que denotavam a tentativa desta psique em se reorganizar, as mandalas. Entretanto, o interesse de Nise na metalinguagem expressa pelos esquizofrênicos espontaneamente em suas pinturas levou-a a ir mais além. Ela se opunha aos psicanalistas que afirmavam não haver transferência na esquizofrenia, o que em psiquiatria relaciona-se ao embotamento e distanciamento afetivo do doente. Nise não concordava com isso e insistia na tentativa do esquizofrênico em formar uma ponte afetiva com o mundo, e mostrava como isto se exprimia nas pinturas e na relação com os animais. Enfim, para ela, o psiquiatra deveria se concentrar na metalinguagem do esquizofrênico, e entender o significado dos seus símbolos .

Clicando aqui é possível saber mais sobre a vida e obra de Nise e ter acesso as obras feitas pelos frequentadores dos ateliês, que estão expostas no Museu do Inconsciente.  

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Algumas das mandalas do acervo do Museu do Inconsciente

                                                                         

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